Caso 3: Pertencer para preservar

Professor: Iaçanã Costa Simões
Quem é o professor: Licenciada em artes visuais, leciona na rede municipal e na escola há três anos. Foi destaque estadual da Bahia, na etapa dos anos iniciais do ensino fundamental (ciclo de alfabetização – 1º, 2º e 3º anos), na 10ª edição do Prêmio Professores do Brasil.

Escola: Escola Municipal Governador Roberto Santos
Municipio: Salvador
UF: Bahia
Etapa de ensino: Ensino Fundamental/Anos Iniciais

Ano: 2017
Área de conhecimento: Linguagens
Componente curricular: Arte

Seja bem vindo e volte sempre! Um olhar para conservação do patrimônio público escolar através da arte.

Como uma professora de Salvador construiu junto com os estudantes intervenções artísticas que tornaram os espaços da escola mais agradáveis e cessaram rotina de degradação

Ao iniciar o ano letivo de 2017, a professora de artes Iaçanã Costa Simões, de 39 anos, percebeu algo curioso no muro da escola municipal em que trabalha no Cabula, em Salvador: os desenhos contornados por ela e pintados pelos estudantes no ano anterior, como parte de um concurso de artes, seguiam intactos, destoando das demais partes do espaço físico do colégio, marcadas mais por pichações, riscos e solas de calçados do que pela ação do tempo.

Iaçanã fotografou aquele pequeno pedaço de patrimônio público preservado e o levou à escola. No trabalho com turmas de crianças dos anos iniciais do ensino fundamental, começou a debater em sala de aula os conceitos de patrimônio público e preservação e, nessa troca, planejou e construiu com eles uma proposta para incentivar e valorizar manifestações artísticas dos estudantes, relacionando-as às necessidades de melhoria e conservação do espaço físico escolar.

“Quando era algo construído e eles achavam bonito, percebi que eles não tinham coragem de degradar. Foi aí que veio a ideia das portas, que eram para mim um incômodo. A gente lecionava em um ambiente sem nenhuma referência visual que remetesse a um universo lúdico para as crianças”, relata. “Faltava o sentimento de pertencer àquele espaço. Eles riscavam, chutavam e quebravam as portas.”

Esse processo de conscientização preparou as crianças e deu força ao início das intervenções artísticas à base de tinta e pincel naquela que é a rota de passagem obrigatória de todos que sentam nos bancos escolares: as portas das salas de aula. Para viabilizá-lo, a gestão da escola comprou uma grande lata de tinta branca e pigmentos corantes líquidos, com os quais seriam preparadas as outras cores.

O tema e quem desenharia e pintaria também foram discutidos coletivamente, dando os contornos para o projeto “Seja bem-vindo e volte sempre! Um olhar para a conservação do patrimônio público escolar através da arte”. As mensagens de acolhimento na parte externa da porta (“seja bem-vindo”) e de gentileza na parte interna (“volte sempre”) foram os pontos iniciais para a criação artística, que envolveu também a valorização do diálogo, da cooperação e da cultura regional.

“Trabalhei com eles a questão da identidade. Trabalhávamos com cores, com diversidade. Quando eles chegavam a um acordo, fazíamos o desenho”, afirma a professora. “Com os meninos do 3º e do 4º anos, foi mais simples essa elaboração. Eles propuseram, por exemplo, desenhar duas pessoas de mãos dadas. Nas turmas dos pequenos, pediram bichinhos, uma borboleta, uma ovelhinha…”

Ao todo, foram pintadas oito portas de sala de aula. A turma da manhã se encarregava de um lado e a da tarde, de outro. Depois, os próprios alunos pediram para ampliar as intervenções. Assim, quatro portas de banheiro, três portas de depósito e outros três ambientes também tiveram suas entradas renovadas pelas pinturas dos estudantes.

“Os estudantes passaram a dizer que a escola estava ficando bonita, a zelar por aquilo que construíram. Passaram a ter um sentido de preservação do patrimônio que não tinham. Nunca mais riscaram nem chutaram as portas. Houve um resultado positivo no aspecto da não violência, inclusive entre eles”, conta a professora.

Ao longo desse processo, além do crescente interesse dos alunos, Iaçanã passou a sentir reações positivas também de funcionários, outros professores e a mobilização em torno do projeto abriu caminho para intervenções maiores. Foi pintado um muro de 22 metros, o portão da escola, entre outros espaços.

Em 2018, o colégio planeja envolver os pais em mutirões para ajudar na arrecadação de materiais e na criação de ambientes lúdicos, tudo no sentido de fortalecer o sentimento de pertencimento das famílias àquela comunidade escolar.

“Educação é uma construção, um processo lento. A gente está erguendo um espaço do brincar e quer que o aluno aprenda e desfrute de um ambiente agradável”, diz Iaçanã. “Nesse começo, é como se a gente conquistasse o aluno para que ele passe a gostar de estar naquele espaço. O primeiro passo foi trazê-lo para que ele quisesse estar dentro daquele ambiente. No futuro, isso pode ter impacto positivo nos índices de evasão e abandono”, acredita a professora.

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