Caso 6: O Haiti é aqui

Professor: Diana Aparecida Feuser Ribeiro
Quem é o professor: Formada em pedagogia, com pós-graduação em psicopedagogia, trabalha há 14 anos na rede municipal e há sete anos na escola. Foi a vencedora de Santa Catarina e da região Sul, na etapa de creche, na 10ª edição do Prêmio Professores do Brasil.

Escola: Centro de Educação Infantil (CEI) Castelo Branco
Municipio: Joinville
UF: Santa Catarina
Etapa de ensino: Educação Infantil / Creche

Ano: 2017
Área de conhecimento:
Componente curricular:

O Haiti é Aqui

Na primeira etapa do berçário, professora de Joinville aprende idioma haitiano e valoriza saberes culturais dos pais para integrar famílias de diferentes origens e ampliar experiências dos bebês

Na reunião com os pais durante a matrícula do primeiro estágio da educação infantil, crianças de 6 meses a 1 ano de idade, a professora Diana Aparecida Feuser Ribeiro percebeu que a integração de uma família haitiana seria um dos principais desafios do ano letivo de 2017. O pai de Woodjerry, então com 1 ano de idade, comunicava-se com dificuldade em língua portuguesa e a mãe só falava francês e crioulo haitiano, os idiomas oficiais do país caribenho.

Como as estratégias de acolhimento são decisivas para a fase de adaptação das crianças na educação infantil, em especial na etapa de berçário, a professora sentiu a necessidade de elaborar estratégias que valorizassem a diversidade de saberes e vivências culturais reunidos naquela turma, que abrigava 18 bebês, parte em período integral e parte em meio período.

A partir da observação da família do Haiti, a professora esboçou o projeto “Sali, koman ouye? Entrelaçando as culturas haitianas e brasileiras no processo de adaptação das crianças do berçário 1”. O planejamento incluiu nova reunião com os pais, agora para falar sobre o projeto e se aprofundar acerca do caldeirão cultural das famílias.

“Conversando com os demais pais percebemos que eles também vinham de fora, de outras regiões do Brasil. Pensamos em estratégias para integrar a cultura haitiana às demais”, afirma a professora Diana, de 37 anos e há 14 na rede municipal de Joinville, norte de Santa Catarina.

Além de se aprofundar sobre a cultura haitiana, a professora Diana detalhou a origem das famílias brasileiras, com foco em culturas regionais mais estranhas às influências presentes em Joinville. “Os pais do Rio e do Paraná estavam adaptados à cidade. Mas as famílias da Paraíba, do Ceará e do interior de São Paulo, além do Haiti, tinham mais diferenças. Pedimos a participação deles e trabalhamos em conjunto”, diz Diana.

Durante a pesquisa, a participação das famílias foi fundamental. Com o pai do menino haitiano, por exemplo, a professora aprendeu expressões de boas-vindas como “sali, koman ouye?” (olá, como vai?), absorveu palavras da língua crioula para um pequeno dicionário para o dia a dia, orientou-se sobre a pronúncia delas e entendeu manifestações populares do país caribenho.

“A gente adaptava para a realidade das crianças as informações que os pais traziam. Estava na época do Carnaval no Haiti. Trouxemos músicas que faziam sucesso lá e nos inspiramos na maneira como festejavam para ambientar a sala com roupas coloridas, máscaras, cangas… Deixamos pendurados para manusearem e cobrimos as crianças com esses tecidos”, relata a professora, que contava com o apoio de duas auxiliares.

Como parte do projeto, os pais deixavam um brinquedo da criança na escola e repassavam fotos de família, que se somaram a imagens selecionadas pela professora sobre o Haiti e as culturas regionais do Brasil. As imagens eram impressas, plastificadas e fixadas nas paredes ao alcance das crianças para manuseio e, principalmente, para que sentissem o espaço como extensão de casa. “Quando a criança começava a chorar, a gente a levava até as fotos para mostrar que o pai e a mãe estavam ali, mostrava um brinquedo de casa. Não era um ambiente estranho”, diz Diana.

Os mapas, as bandeiras e os hinos nacionais do Brasil e do Haiti também fizeram parte da ambientação da sala, que se renovou com frequência ao longo dos quatro meses do projeto. Em relação às culturas regionais, houve a desconstrução de um pau de fita para que as crianças manuseassem, o contato com o bambu, a dança do Bumba Meu Boi, leitura de poema sobre o Ceará, canção de Fagner, músicas de circo, entre outras referências baseadas nas lembranças da terra natal e da infância dos pais brasileiros.

Algumas músicas de letras simples, cantadas em sala, foram traduzidas para o crioulo haitiano e entoadas em português e depois no idioma estrangeiro. “As crianças se habituaram e, quando a gente não cantava em crioulo, algumas reagiam levantando as mãos, porque esperavam que a gente cantasse em crioulo também”, lembra Diana.

A experiência conjunta levou a uma afinidade crescente entre brasileiros e haitianos na comunidade escolar e, segundo a professora, desmistificou ideia limitada de berçário, além de contribuir de forma decisiva para uma rápida adaptação dos bebês.

“Muita gente fala que berçário é somente o cuidar, que são pequenos, não fazem nada, como vão aprender etc. O que a criança aprende entre 0 e 3 anos leva para o resto da vida. Eles não vão lembrar, mas vivenciaram atividades que vão ajudá-los. É possível criar um leque (de experiências) maior, tornando a descoberta mais ampla.”

O projeto foi reunido em livro. Cada criança recebeu um, encapado e amarrado com um barbante, com fotos da família e a história da gestação, contada pelos próprios pais. Todos os alunos continuaram matriculados na escola, que em 2018 recebeu uma nova família haitiana.

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